“Ainda vale comprar ações”

Formado em administração de empresas, o Gestor de Renda Variável, Fabio Motta de 45 anos, participa hoje dando dicas sobre como montar um portfólio de investimentos.

Motta tem mais de 20 anos de experiência no mercado financeiro e hoje trabalha como gestor de fundos de ações de uma das maiores gestoras de recursos independente do país, a Western Asset. A empresa Western faz a gestão de R$41 bilhões em recursos de terceiros no Brasil, dos quais R$3 bilhões estão alocados em ações. No mundo, a Western administra US$430 bilhões de recursos de terceiros. Ao longo de sua carreira, Motta já trabalhou em duas outras instituições internacionais, o Citibank e o ING. Ele sempre atuou na área de gestão de recursos e se especializou na área mais instigante do mercado financeiro que é aquela que lida com a análise e escolha das melhores empresas a se investir.

Como poupador disciplinado, ele afirma que sempre poupa pelo menos 30% de sua renda e constantemente monitora seu portfólio, mas prefere avaliar o desempenho em períodos não inferiores a um ano.

Qual foi seu investimento mais malsucedido e o mais bem-sucedido?
O pior investimento que realizei foi nas ações da PDG entre 2011 e 2012. A ação já tinha caído mais de 40% e, mesmo usando premissas bem conservadoras, eu via um potencial de apreciação que parecia compensar o risco. Obviamente, eu estava subestimando os problemas que a empresa enfrentava: o aumento de alavancagem, a dificuldade de administrar uma grande quantidade de obras e os estouros de orçamento. Acho que perdi quase 40% naquele investimento antes de decidir pela venda. Mesmo com a perda, vender foi uma boa decisão, pois desde então a ação perdeu quase 99% do seu valor. Meu melhor investimento foi em ações de small caps (ações de empresas com baixo valor de mercado) durante a crise de 2008. Várias dessas ações estavam depreciadas por conta de vendas forçadas, pois vários fundos de investimentos foram obrigados a vender as ações que detinham para pagar os resgates dos clientes. Eu comprei ações da Tegma, Banco ABC e Company (incorporadora que depois virou a Brookfield) no final de 2008. Estas ações tiveram altas de 260% a 370% até o final de 2009.

O que sugere como alocação para um investidor de perfil moderado?
Os investidores com idade inferior a 35 anos, que ainda estão na fase de acumulação e possuem bastante tempo para recuperar eventuais perdas, podem ter uma maior alocação em ações. Aqueles poupadores que já se aproximam da aposentadoria deveriam pensar em reduzir o risco da carteira justamente, pois vão começar a realizar retiradas e viver da renda dos investimentos. Os que já estão aposentados deveriam focar quase que exclusivamente em preservação de capital, com pouca ou nenhuma renda variável. O percentual em si depende do ambiente de juros. Se estivéssemos nos EUA ou em algum outro país com juros estruturalmente baixos, eu diria que um investidor jovem de perfil moderado poderia ter entre 40% e 50% de seus investimentos em ações. No Brasil, onde ainda temos juros reais próximos de 5% ao ano, um investidor com essas características poderia ter entre 20% e 25% em bolsa.

O que leva em consideração para selecionar um fundo de investimento dentro de seu portfólio?
Além de olhar a performance apresentada num prazo suficientemente longo, é importante ver qual foi o risco incorrido para a obtenção dessa performance. Para tanto, o investidor precisa olhar a composição do fundo com alguma regularidade. É possível que o retorno alto se deva exclusivamente a uma maior exposição a risco, e não necessariamente habilidade do gestor. É bom saber também qual é o estilo de investimento do gestor e se ele se mostra fiel a este estilo. Se um fundo de ações se apresenta na categoria Valor, não deveria ser composto de empresas caras (por exemplo, com múltiplos de negociação alto) e com perspectiva de forte crescimento de lucro. Se um fundo de ações está classificado como de Dividendos, deve ser composto majoritariamente por empresas que efetivamente pagam bons dividendos.

Qual periodicidade avalia os investimentos em seu portfólio?
Eu prefiro avaliar meus investimentos em prazos não inferiores a um ano. Parece muito tempo, mas a fixação em avaliar performances de curtíssimo prazo é um dos grandes detratores de retorno. A movimentação acarreta em custos. Além disso, movimentar o portfólio pode ser ineficiente em termos de imposto de renda e força o investidor a escolher fundos ou títulos com liquidez alta e não necessariamente aqueles com melhor potencial de retorno.

Compraria ações no atual momento de instabilidade política e baixo crescimento econômico?
Sim. Apesar da alta recente, o cenário ainda é favorável para a renda variável. A taxa Selic deve ficar abaixo dos 8% ao ano antes do fim de 2017, e os juros longos também devem continuar caindo. Isso faz com que investimentos em ações fiquem mais atrativos. É importante mencionar que investidores institucionais, por exemplo, fundos de pensão ainda têm uma alocação em bolsa muito baixa e devem aumentar gradativamente com a queda dos juros. Também investidores estrangeiros têm bastante potencial para aumentar sua aposta em ações brasileiras. Além disso, a perspectiva de recuperação de lucros das empresas brasileiras para os próximos anos também faz com que o retorno esperado da bolsa fique consideravelmente acima do que eu vejo para a renda fixa. A grande dúvida é a eleição presidencial de 2018. Dependendo do resultado desta eleição, o cenário pode ser bem diferente deste que eu estou projetando.

(Marcelo Justo/ Folha Press)

Se tivesse que indicar uma ação ou setor, qual seria e porquê?
Gosto de ações que se beneficiam da queda de juros em curso. Alguns exemplos são Iochpe-Maxion, Lojas Americanas e CCR. Falando especificamente de uma ação, eu gosto muito da IMC (MEAL3), que é a dona das redes de restaurante Viena, Frango Assado e outros. A empresa passou por um profundo processo de restruturação e os resultados já começam a aparecer.

O que sugere de renda fixa para um investidor que pensa na aposentadoria?
Para uma pessoa ainda no início da carreira profissional, ou seja, aquela que tem tempo e disposição para suportar volatilidade, os títulos do Tesouro atrelados ao IPCA são uma alternativa muito boa. Em especial, eu gosto da NTN-B 2045 (Tesouro IPCA). Já para investidores com idade próxima da aposentadoria, sugiro um um balanço entre fundo DI, NTN-B de prazo mais curto, LFT e fundos multimercados.

Qual livro sobre investimentos recomenda?
Recomendo o livro ainda sem tradução para o português do autor Howard Marks: The most important thing.