Entenda o valor total e relativo das empresas
Investidores do mercado financeiro se concentram nas cotações dos ativos e muitas vezes esquecem de avaliar o valor total do ativo e de relativizar esse valor com o de outros comparáveis. Esse efeito ocorre especialmente no mercado de ações e com os pequenos investidores que possuem menos acesso a informação. Nesse sentido, trago hoje uma série de comparativos para ajudá-lo a entender melhor o valor das ações e empresas pertencentes ao índice IBX100 da bolsa de valores B3.
Quando você vai comprar qualquer ativo, seja ele um imóvel, um carro ou eletrodoméstico, avalia o valor total do bem e não apenas o valor de uma fração dele. Pequenos investidores quando vão comprar uma empresa negociada em bolsa focam no preço da fração que é representada pela ação e esquecem de avaliar o todo. O valor de mercado das ações é calculado multiplicando o valor da ação pela quantidade.
As dez maiores e menores empresas em termos de valor de mercado de suas ações são apresentadas abaixo. Embora seja a maior empresa brasileira em valor de mercado das ações, a Ambev seria a quinquagésima empresa do índice americano S&P500. Dentre as 500 empesas que formam o S&P500, a menor delas seria a quinquagésima quarta maior empresa no nosso índice IBX100.
Entretanto, olhando apenas para o valor de mercado total, não é possível dizer quem está mais barato. Precisamos de uma métrica para padronizar esse valor. Quando um investidor vai comprar um imóvel, ele avalia além do valor total, o valor por metro quadrado. Este último valor é especialmente importante, pois padroniza o valor total do imóvel e permite que se compare preços de imóveis que possuem tamanhos diferentes.
A mesma padronização é feita com ações, dividindo o preço de mercado das ações pelo lucro esperado no próximo ano. A escolha do lucro do próximo ano é explicada porque o valor de uma empresa é suportado pelos resultados futuros que a empresa vai produzir e não pelos resultados passados.
Observa-se acima as dez empresas que apresentam as maiores e menores razões de preço de mercado das ações sobre lucro. Estudos acadêmicos (Basu 1977 e 1983) apontam que portfólios montados com as empresas com menor razão Preço/ Lucro (P/L) tendem a desempenhar melhor no ano seguinte que portfólios constituídos pelas empresas com as maiores razões.
O indicador P/L pode ser entendido como o prazo em anos para se recuperar o investimento se o lucro fosse inteiramente distribuído ao acionista. Por exemplo, no caso da Cemig, demoraria apenas 5,4 anos para se obter o valor do investimento de volta, considerando que o lucro não caia nos anos seguintes e que ele fosse integralmente pago ao acionista. O prazo para se obter o investimento de volta é usualmente chamado de Payback. Assim, o múltiplo P/L pode ser comparado à métrica Payback utilizada na análise de pequenos investimentos.
Outra forma de se interpretar o P/L é calcular o inverso dele. O inverso dessa razão resulta no índice chamado em inglês de Earnings yield (ganho por lucro). Novamente, utilizando a Cemig como exemplo, seu P/L produz um ganho por lucro de 18,5% ao ano (=1/0,0542). No caso da Raia, o ganho por lucro seria de apenas 2,4% ao ano (=1/0,4167).
Assim como há imóveis que negociam com a razão preço por metro quadrado mais baixa que a média por razões específicas como qualidade e localização, também há empresas que estão com múltiplos baixos por um motivo. Portanto, é preciso avaliar detalhadamente, pois não é porque o múltiplo está baixo que é uma barganha. No entanto, analisar os múltiplos como o P/L pode chamar sua atenção para empresas que estão baratas e outras cujos preços não fazem sentido relativamente a outras empresas.
Como nem todo o lucro é distribuído ao acionista, é interessante acompanhar o índice chamado de ganho por dividendos que é calculado dividindo o dividendo a ser pago no próximo ano pelo valor atual da ação. Na tabela abaixo é possível verificar que os dez maiores ganhos de dividendos superam a rentabilidade obtida com o CDI líquido de IR. Se o preço da ação em um ano for o mesmo que o atual, terá recebido mais que o CDI em dividendos líquidos de IR.
Assim, ao avaliar a aquisição de ações, não olhe apenas para a cotação. É importante calcular o valor total e relativo padronizado por indicadores financeiros e operacionais para entender se esse faz sentido relativamente a outras empresas do mesmo setor e do mercado em geral. Lembro que esses não são os únicos indicadores para avaliar uma empresa. Em futuros artigos explicarei sobre outras formas de avaliação.
Referência:
Sanjoy Basu, “The Investment Performance of Common Stocks in Relation to Their Price-Earnings Ratios: A Test of the Efficient Market Hypothesis,” Journal of Finance 32 (June 1977), pp. 663–82; e “The Relationship between Earnings Yield,Market Value, and Return for NYSE Common Stocks: Further Evidence,” Journal of Financial Economics 12 (June 1983).