Não compre imóvel antes de ouvir esse especialista
Comprar o imóvel certo que proporcione segurança de valorização e renda de aluguel adequada é um desafio que se tornou ainda maior com a forte alta de preços ocorrida entre 2010 e 2015. As principais dúvidas dos investidores são quais critérios deveriam ser utilizados para comprar e para vender imóveis e qual o melhor veículo para ter a exposição imobiliária.
Para explicar as principais dúvidas dos investidores no processo de investimento nesse veículo conversei com um especialista em fundos de investimento imobiliários (FII), Raul Grego. Grego é um dos analistas da empresa de pesquisa independente Eleven Financial Research. A casa de análise existe desde 2015 e possui uma gama de produtos voltados para aplicação financeira, específicos para cada tipo de investimento, dentre eles um que é focado em Fundos Imobiliários (Riqueza em Construção).
Além de contribuir com seus conhecimentos, Raul, gentilmente, compartilhou um de seus relatórios recentes para que o investidor entenda o trabalho de pesquisa que é realizado para avaliar se um FII é um bom investimento. O relatório completo está disponível no final da entrevista.
Como analisar um fundo de investimento imobiliário (FII)?
A análise de um FII pode ser dividida em duas etapas: qualitativa e quantitativa. Na etapa qualitativa são avaliados critérios como: gestão, caracteríticas do fundo, diversificação da carteira, tipo de imóvel, localização, demanda pelo imóvel e outros.
Na avaliação da gestão, são ponderados o histórico do gestor, sua experiência e visões sobre o mercado. Com relação às características do fundo, são identificadas as taxas envolvidas, os administradores e a existência e qualidade de consultores. A diversificação do fundo é importante, mas não essencial, pois o FII pode ter apenas um imóvel, porém com qualidade inquestionável.
Todos já ouvimos falar que quando se avalia um imóvel deve-se atentar para três critérios: localização, localização e localização. Esses não são os únicos critérios para fundos imobiliários, mas sem dúvida têm um forte peso.
Quando se analisa o tipo de imóvel, os contratos de aluguel devem ser investigados a fundo. Todas as características dos contratos devem ser analisadas. Se eles são atípicos, ou seja, com prazos acima de cinco anos e com exigências de garantia de cumprimento até o vencimento, ou se são típicos, isto é, contratos padrão com menor segurança de manter o locatário.
O investidor de FII pode ganhar com a valorização de preço e com o ganho de dividendo. Portanto, na análise quantitativa, é construído um modelo de dividendos descontados, no qual se determina a capacidade e sustentabilidade de pagamento de dividendos pelo fundo e o potencial de ganho de capital por valorização. Um exemplo é o apresentado na figura abaixo.
Quando um FII deve ser vendido?
A decisão de vender um FII pode ser fundamentada em dois critérios: preço e ganho de dividendos. Se o preço justo baseado no modelo de dividendos descontado não se mostrar satisfatório ou se a perspectiva de dividendos futuros se mostrar desfavorável, o FII pode ser colocado a venda.
Olhando pela ótica dos ganhos de dividendos, manter um FII se mostra desfavorável quando a rentabilidade resultante da divisão dos dividendos anuais futuros pelo preço negociado do FII se mostrar pior que o retorno real promovido por um título público referenciado à inflação de longo prazo, por exemplo, a NTN-B 2050. Logo, se o ganho de dividendo esperado for menor que 5% ao ano (acima da inflação), é melhor trocar por outro FII.
Nessa análise, é necessário tomar cuidado com o julgamento simples do dividendo atual, pois o que importa são os dividendos futuros. O dividendo atual, pode estar baixo por um aspecto conjuntural e ter potencial de alta. Portanto, seria recomendável manter esse FII em carteira. Assim como, o dividendo atual pode estar alto, mas a perspectiva ser de queda. Esta é a situação que abordarei em seguida, e nela, deve-se procurar o melhor momento para venda.
Um fator importante a ponderar na decisão de venda é o risco dos dividendos futuros cessarem ou serem reduzidos. Isso pode ocorrer por perspectiva de vacância, revisão de aluguel ou quebra de contrato. Essas condições, em menor ou maior grau, estão presentes nos FII de agências bancárias – por exemplo. A evolução tecnológica tem feito os bancos diminuirem o número de agências. Adicionalmente, vários contratos estão com preços acima de mercado, devido à renovação por inflação sem direito a revisionais. Logo, os dividendos desses FIIs devem cair ao longo do tempo.
É possível fazer alguma associação dessa estratégia de venda com o aluguel que as pessoas recebem de seus investimentos em imóveis residenciais?
Usualmente, as pessoas gostam de comprar imóveis residenciais como investimento para alugar. Avaliando a taxa de aluguel que em média se ganha, essa compra não deveria ser realizada. De acordo com o índice FipeZap, a taxa média de aluguel é menor que 5% ao ano. Portanto, esses imóveis residenciais são piores investimentos que muitos FIIs, que podem ter rendimentos isentos de IR superiores a 6% ao ano (acima da inflação). Assim, muitos investimentos em imóveis residenciais poderiam ser trocados por uma carteira de FIIs para obter maiores retornos.
Quantos FIIs deveriam compor o portfólio de um investidor?
Para uma carteira de FII ser considerada como diversificada o número de FII que seria interessante manter é de seis a oito. O número é menor do que o normalmente recomendável para carteiras de ações, mas é preciso considerar que os próprios fundos, na maioria das vezes, já são diversificados em vários imóveis. Com essa quantidade já é possível ter uma boa divisão entre segmentos e regiões, de forma a mitigar os riscos envolvidos para a classe de ativos imobiliários.
Quais setores de FII possuem o maior potencial de valorização?
Dois setores apresentam boas perspectivas: lajes comerciais e shopping centers. A retomada econômica deve favorecer ambos.
O setor de lajes comerciais deve ser avaliado na perspectiva do ciclo de lançamentos e este ciclo costuma evoluir de forma inversa ao econômico. Nos momentos em que a economia cresce forte, novos empreendimentos são iniciados, pois a demanda por escritórios é elevada e os retornos são altos. Esses empreendimentos demoram cerca de dois a três anos para serem entregues. Portanto, quando o ciclo econômico reverte, muitas vezes, é o instante em que uma grande oferta de imóveis está chegando ao mercado. Logo, a sobreoferta de imóveis promove temporariamente a queda de rentabiliadde dos aluguéis comerciais.
Esse fato foi justamente o que ocorreu nos últimos dois anos. Olhando para frente, a perspectiva é de um menor número de entregas e um crescimento da demanda, combinado com o início de um reaquecimento da economia. Assim, é esperado que ocorra uma suboferta de imóveis e o retorno dos aluguéis comerciais seja reajustado acima da inflação.
O setor de shoppings deve ser beneficiado pelo aumento do fluxo de pessoas e veículos que eleva as receitas de estacionamento e dos lojistas. A maior receita dos lojistas favorece a revisão dos alugueis e reduz a inadimplência e vacância.
Se o veículo FII é tão bom, por que alguns investidores têm aversão ao produto?
Os FIIs são os melhores veículos para se investir em imóveis. Eles agregam vários benefícios ao investidor, como o custo de aquisição, a isenção de IR, liquidez, menor risco e maior possibilidade de retorno. Mais do que simplesmente um instrumento financeiro eles são empreendimentos imobiliários, que são negociados em bolsa de valores. Isso faz com que seus preços sejam visualizados em tempo real e as oscilações de preço assustam os investidores. Já no investimento direto em imóveis, o preço só é apurado no momento de venda, ou seja, não se sofre com oscilações intermediárias.
Quando os FIIs foram lançados no mercado nacional em grande volume (entre 2011 e 2013), os investidores confundiram com aplicações de renda fixa e alocaram uma participação do patrimônio maior que a recomendável. Entretanto, imóveis são aplicações de renda variável – seja direta ou indiretamente, pois o preço de um imóvel oscila e o fluxo de pagamentos de aluguel é incerto. Dessa forma, a exposição a esse tipo de aplicação deve ser cuidadosamente medida de acordo com o perfil do investidor.
Acredito que os atuais investidores amadureceram e já entenderam que o investimento em imóveis tem risco, é um instrumento de longo prazo com bom potencial e o veículo FII, sem dúvida, é o melhor para capturar este potencial.