Siga estes 4 passos para ganhar com IPOs
Você já ouviu falar da relação entre a rêmora e o tubarão? No mercado financeiro, os “tubarões” são os investidores especialistas que, pelo seu tamanho e força, ditam a intensidade e direção dos movimentos das ações. Os pequenos investidores, conhecidos como “sardinhas”, muitas vezes vêem seus lucros sendo devorados pelos anteriores.
Ao contrário do que muitos imaginam, ganhar dinheiro com ações é uma tarefa árdua. Existem grandes vantagens de se aproveitar dos benefícios dos especialistas. No entanto, existe um momento em que você, pequeno investidor, pode se comportar como uma rêmora.
A rêmora é uma espécie de peixe que aproveita a carona do tubarão e ainda se alimenta de restos de comida deixados por este último.
Este momento ocorre na oferta inicial pública de ação, conhecida como IPO. Em um IPO uma empresa lança e inicia a negociação de sua ações em bolsa de valores.
Neste instante, o volume financeiro negociado é proporcionalmente grande, pois costuma ser vendido mais de 20% do valor da empresa. Fazendo uma analogia, é o período em que existe muito “sangue” no mar. Portanto, atrai muita atenção dos investidores especialistas, os tubarões. E você, “rêmora”, pode se aproveitar. E é isto que vou explicar como.
Existe um efeito com os IPOs empiricamente e mundialmente comprovado ao longo do tempo. Este efeito foi denominado IPO underpricing. Ou seja, na média os IPOs, no primeiro dia de negociação, se valorizam.
Qual a razão para o IPO underpricing?
Segundo o pesquisador da universidade Nova de Lisboa, João Amaro de Mattos, os seguintes fatores explicam esse efeito:
- Reputação dos bancos coordenadores da oferta: Bancos que participam da oferta tendem a fixar um preço suficiente para garantir que a oferta seja bem sucedida, pois temem que um fracasso pese sobre sua reputação;
- Demanda excedente por corte: como muitos investidores são cortados, devido a alta demanda, estes costumam comprar o que desejavam no primeiro dia;
- Assimetria de informação: a falta de informação pelo pouco tempo para análise e escassez de dados faz com que os investidores especialistas demandem um desconto para compensar os riscos.
Você pequeno investidor tem uma vantagem sobre os grandes. Devido ao critério de dispersão, desejado nas ofertas públicas, os pequenos investidores são proporcionalmente mais alocados que os grandes. E no primeiro dia, pode vender tudo sem causar impacto considerável, mas apenas atendendo à demanda compradora do mercado, explicada no segundo fator acima.
Qual o retorno médio passado?
Os estudos acadêmicos apontam uma valorização média de cerca de 3% no primeiro dia de negociação das ações brasileiras em relação ao preço de emissão. Esta média de ganhos foi superior a 5% no período entre 2004 e 2008, segundo os pesquisadores José Silva e Rubens Famá, publicado em 2011 na Revista de Administração da USP.
Curiosamente, os retornos médios, passados dois anos da emissão foram negativos, o que vai ao encontro com a suspeita de que os investidores costumam superestimar os resultados das empresas no lançamento de suas ações. Portanto, cuidado com a tentação de manter a ação em carteira.
As evidências em estudos internacionais apontam para um retorno ainda maior no primeiro dia de negociação. Thomas Boulton et al acompanhou a negociação de 4462 IPOs, em 29 países, entre 2000 e 2004, e encontrou uma média de retorno de 28% no primeiro dia de negócios.
No mercado internacional, no mês passado, vimos os investidores entusiasmados com o primeiro dia do lançamento da concorrente do Uber, a Lyft, mas se decepcionando nos dias seguintes. A ação da Lyft subiu 8,7% no primeiro dia, mas, passado um mês, já está quase 20% abaixo do seu preço de IPO de US$ 72.
Nesta última quinta-feira, também nos EUA, tivemos as emissões das ações da rede social Pinterest e da empresa Zoom, que subiram, respectivamente, 28% e 72% no seu primeiro dia. Acompanhe o comportamento delas nos próximos dias.
Quais os passos para aproveitar a oportunidade?
A maior parte dos pequenos aplicadores ficam tentando descobrir qual IPO deve se valorizar mais no curto prazo. Isto é perda de tempo. Se para os investidores especialistas a análise já é difícil, devido à escassez de informação, um IPO é quase uma loteria para o aplicador pessoa física.
Vários caem na falácia da empresa que conhecem e aderem às ofertas de empresas conhecidas, ou que estão muito faladas na mídia, como as do Burger King no ano passado e da Centauro este ano. Ambas caíram mais de 1% no primeiro dia de negociação. Isto nos leva ao primeiro passo.
Não escolha. Entre em todos os IPOs.
O ganho que é apresentado acima nos estudos é uma variação média. Algumas operações serão bem sucedidas, e outras apresentarão prejuízo. Você precisa entrar em todos para se valer do ganho médio.
O ímpeto de controlar algo faz com que alguns queiram definir o preço que comprarão. Você não está no controle, quem controla são os grandes, os “tubarões”. Portanto, aqui vai o segundo passo.
Não defina preço limite.
Pode parecer irresponsabilidade não definir um preço limite, mas isso evitará com que você seja cortado de uma eventual boa operação. E perder uma boa operação pode acabar com a estratégia de ganhar na média, pois certamente você pegará emissões ruins mesmo quando fixar um preço limite. Assim, vai precisar das boas, mesmo quando elas parecem caras, a princípio, para compensar os momentos de queda. Lembre-se seu objetivo não é investir para o longo prazo, mas apenas por um dia.
Adicionalmente, se a oferta for ruim, os “tubarões” tenderão a reduzir o preço. Caso ela seja boa, eles demandarão muito e elevarão o preço da oferta. Mas você poderá contar com estes “tubarões” se esforçando para sustentar o preço após a emissão. Assim, estará se comportando como “rêmora”.
Desde 2004, a pior perda no primeiro dia de negociação ocorreu com as ações da Le Lis Blanc, em 29/04/2008, quando ela caiu 18,8%. No mesmo período, a maior alta ocorreu com as ações da Bovespa que subiram 45,8% no dia inicial em 26/10/2007.
A mitigação de seu risco é promovida pelo terceiro passo.
Limite o valor alocado.
O controle de risco vem pelo montante que adere às ofertas de IPO. Evite alocar mais que 5% de seu patrimônio financeiro.
Lembre-se que em várias operações, o resultado será negativo. E talvez você perca em várias emissões seguidas até ter um ganho que compense.
Portanto, vai precisar alocar sempre o mesmo valor. Assim, se tem um patrimônio de R$100 mil, não se recomenda entrar nas emissões com um valor superior a R$ 5 mil. E se escolher este valor, ele deve ser igual em todas as operações.
Se tivesse feito isto, a perda de R$ 1 mi nas ações da Le Lis Blanc que mencionamos acima seria mais que compensada com o ganho de R$ 2,3 mil nas ações da Bovespa.
O valor de 5% do patrimônio e o ganho de 3% podem parecer pouco. No entanto, no mês que houver IPO, se ganhar 3% nesta participação de 5% e investir com baixo risco e liquidez nos 95% restante, ganhando o CDI de 0,52% ao mês, a rentabilidade de todo o portfólio será de 124% do CDI.
O quarto passo é um dos mais difíceis, pois vai exigir algo que não nos é natural, a disciplina.
Saia no primeiro dia.
Em alguns momentos a oferta será bem sucedida e você desejará manter as ações, pois acredita que ela vai subir ainda mais. Em outros momentos, ela cairá no dia do lançamento e você desejará segurar para tentar recuperar.
Nos dois casos, está quebrando a disciplina da estratégia de vender no primeiro dia em que, na média, se alcança o melhor resultado. Como já explicamos acima, os investidores tendem a superestimar a capacidade de crescimento da empresa no médio prazo e as ações acabam por desempenhar pior que um índice de referência como o Ibovespa em períodos de até dois anos.
Reforço que a aquisição de ações em suas ofertas iniciais possui alto risco. Todo investimento que envolve ativos de renda variável pode apresentar perda do capital investido. No entanto, acredito que se seguida com disciplina, a estratégia acima deve apresentar resultados melhores do que o investidor individual tentar acertar qual emissão (IPO) apresentará resultado positivo.
Michael Viriato é professor de finanças do Insper e sócio fundador da Casa do Investidor.