Três razões para você vender agora seus títulos do Tesouro Direto

A grande valorização de alguns títulos públicos, negociados na plataforma do Tesouro Direto, atraiu a atenção de vários investidores. Não é para menos. Em média, quem investiu em 2018 nos títulos com vencimento em 2045, está ganhando 57% de valorização até a última sexta-feira (31/05/2019). Mas em vez de comprar agora, você deveria estar pensando em vender.

O risco está nos títulos de longo prazo (mais de 10 anos de vencimento) que representa cerca de 19% do total emitido pelo Tesouro para as pessoas físicas.

Quem investiu em meados de junho do ano passado no título Tesouro IPCA+ 2045 obteve uma valorização de 81% até o final de maio.

Entretanto, esse retorno não deve se repetir.

De fato, essa forte valorização nada mais é que a antecipação dos retornos futuros. No caso de quem comprou em junho do ano passado, a valorização representa todo o retorno que ele obteria em seis anos investido na taxa de aquisição de IPCA+6%.

O que justifica a valorização foi a queda das taxas de juros futuras. Não foi a queda da taxa Selic, que neste período se manteve estável. Para entender esta relação entre os juros futuros e o preço dos títulos, imagine uma gangorra, que é um brinquedo infantil comum nos parques. E, ao invés de haver uma criança, em cada lado da gangorra, há a taxa de juros futura de um lado e do outro o preço do título.

Efeito da alta da taxa de juros sobre o preço do título de renda fixa. Quando a taxa cai, o preço sobe.

Quando a taxa de juros futura cai, o preço do título sobe. No entanto, esta alta dos preços é limitada.

A taxa de juros futura não pode cair indefinidamente.

Esse é o primeiro motivo para avaliar a venda agora. Na média, o investidor que aplicou no ano passado, já antecipou mais de quatro anos de ganhos.

O gráfico abaixo mostra a taxa de juros real de um título com prazo de vinte anos desde 2013. Já chegamos a um patamar similar aos mínimos atingidos em 2013.

Evolução da taxa real de juros (acima da inflação) de um título com vencimento em 20 anos. A taxa real hoje se encontra em 3,90% (+ IPCA). Esta taxa é próxima da mínima atingida em 2013. Fonte: Bloomberg.

Aqueles que acreditaram na valorização indefinida dos preços dos títulos em 2013, amargaram retornos medíocres nos últimos seis anos. Não existia o título com vencimento em 2045 naquela época, mas existia Tesouro IPCA+ 2035.

Quem investiu no título Tesouro IPCA+ 2035, no final de janeiro de 2013, ganhou até a última quinta-feira 82,2%.

Você sabe quanto ganhou quem investiu em um título que remunera o CDI no mesmo período?

O aplicador que preferiu o CDI nestes mais de seis anos ganhou 84,4%. Ou seja, ganhou mais e não teve de se preocupar em perder dinheiro se precisasse vender seu título antecipadamente.

 

A taxa de juros real relativamente a outras já está na mínima

A venda também se justifica se olharmos na ótica relativa. O spread (diferença) entre a taxa de juros real (acima da inflação) brasileira e a americana já está na mínima histórica. Isso deixa pouco espaço para maiores quedas. A evolução deste spread pode ser acompanhada no painel inferior do gráfico abaixo.

O gráfico no painel superior mostra na linha de cor preta a evolução da taxa real de juros (acima da inflação) de um título com vencimento em 20 anos brasileiro. A linha na cor laranja representa um título de mesmas características, mas emitido pelo governo americano. No painel inferior há o spread entre as duas taxas. O spread está na mínima histórica. Fonte: Bloomberg.

Adicionalmente, quando comparada com o risco país, medido pelo Credit Default Swap (CDS), a taxa de juros real caiu na frente da queda do primeiro (ver gráfico abaixo). Ou seja, maiores quedas do risco país como reflexo de aprovação da reforma da previdência e, consecutivamente, de melhoria da trajetória de dívida do país, já estão em boa parte refletidas no preço dos títulos.

O gráfico no painel superior mostra na linha de cor laranja a evolução da taxa real de juros (acima da inflação) de um título com vencimento em 20 anos brasileiro. A linha na cor preta representa o risco Brasil medido pelo Credit Default Swap (CDS). Fonte: Bloomberg.

 

O risco destes títulos é muito elevado

Não só a perspectiva de ganhos adicionais parece reduzida, mas o risco é elevado.

Já falamos o quanto os investidores que investiram em taxas similares em 2013 devem estar arrependidos. Caso a reforma da previdência sofra algum ruído como atraso ou não aprovação, as perdas no curto prazo, para os atuais investidores serão bastante elevadas.

O gráfico abaixo mostra a evolução dos retornos em períodos de vinte dias do título Tesouro IPCA+ 2045. Perceba que existem momentos em que a perda pode chegar a mais de 15% em um período de 20 dias.

Evolução dos retornos em janelas de 20 dias do título Tesouro+ 2045.

Uma forma tradicional de se medir o risco de investimentos é calcular a dispersão dos retornos pela estatística chamada desvio padrão. Nesta métrica, o risco deste título seria de 29% ao ano.

Para entender como este risco é elevado, utilizando a mesma métrica, o risco do Ibovespa é de cerca de 20% ao ano. Portanto, menor que o deste título público de longo prazo.

Assim, cuidado ao olhar para o retorno recente quando desejar investir nos títulos de longo prazo negociados no Tesouro Direto. Em vez de comprar, deveria avaliar a venda destes.

 

Michael Viriato é professor de finanças do Insper e sócio fundador da Casa do Investidor.