Guru dá três justificativas para explicar se a bolsa está cara

Depois da valorização contínua do Ibovespa nos últimos quatro anos, investidores se questionam se ela já estaria sobrevalorizada. O principal índice de ações da bolsa de valores B3 subiu cerca de 142% desde o final de 2015, representando uma alta média anual de 25%. Entretanto, não são apenas os investidores brasileiros que debatem esta questão.

A discussão no hemisfério norte, dentre aqueles que aplicam na bolsa americana, é a mesma. O S&P 500 se valorizou 345% desde o fim de 2008, o que significa uma alta média anual de 14,5% no período.

Dada intensa discussão, o reconhecido professor da Universidade de Nova Iorque, Aswath Damodaran, quebrou sua posição de não discutir se o índice estaria caro ou barato e deu sua opinião em seu canal no Youtube.

Os principais argumentos que Damodaran utiliza para justificar sua visão sobre o índice americano podem ser utilizados para a bolsa brasileira. Então, resumo a seguir estes pontos.

Índices x Lucro

Ao contrário de outros momentos de euforia, a apreciação dos índices de ações é suportada por alta proporcional dos lucros médios das ações.

Os gráficos abaixo apresentam o índice Ibovespa e o S&P500 representados pelas linhas verdes e o lucro por ação médio destes índices pela linhas pontilhadas em cinza. O primeiro gráfico é o do índice brasileiro e o segundo do americano.

Evolução do Ibovespa (linha sólida verde) e dos lucros médios (linha pontilhada cinza) que o formam. Fonte: Bloomberg.

Perceba como os índices seguem de perto seus respectivos lucros. No caso do Brasil, o lucro por ação, conhecido pela sigla em inglês EPS, subiu mais de 117% desde 2015. Como citado acima, a bolsa se valorizou 142% neste mesmo período. Portanto, não se pode dizer que a alta é injustificada.

O mesmo argumento pode ser empregado para a bolsa americana. O S&P 500 subiu 45% desde 2015 e os lucros cresceram 37% no mesmo período.

Evolução do S&P 500 (linha sólida verde) e dos lucros médios (linha pontilhada cinza) das ações que o formam. Fonte: Bloomberg.

Múltiplo Preço/ Lucro

Assim como quando vamos comprar um imóvel perguntamos qual o preço por metro quadrado, antes de comprar uma ação, investidores desejam saber qual o múltiplo preço por lucro (P/L) do ativo.

Esse múltiplo é internacionalmente reconhecido e utilizado para avaliar se um determinado mercado ou ativo estaria atrativo para aquisição.

O P/L é uma forma de melhor entender se os preços das ações teriam subido mais forte que seus lucros.

Quando se avalia este índice é importante verificar não só se ele está mais alto que a média, pois o passado pode estar sendo influenciado por um período em que as taxas de juros eram mais elevadas.

O gráfico abaixo apresenta o múltiplo P/L na linha tracejada em cinza. Perceba que o P/L atual do Ibovespa está pouco acima de sua média histórica. Portanto, também nesta métrica não é possível afirmar que o mercado brasileiro estaria sobrevalorizado.

Evolução do Ibovespa e de seu múltiplo Preço/ Lucro. Fonte: Bloomberg.

Também o P/L do índice americano se encontra pouco acima de sua média histórica. Entretanto, é interessante notar que o mesmo está abaixo do momento em que houve a quebra da bolha das empresas de internet no início do atual século.

Evolução do S&P 500 e de seu múltiplo Preço/ Lucro. Fonte: Bloomberg.

Damodaran argumenta que há razão para os múltiplos estarem acima de suas médias históricas e ela é explicada a seguir.

Taxa de juros e taxa de dividendos

A alternativa básica que se tem para a alocação em bolsa é o investimento em títulos de renda fixa.

No entanto, as taxas de juros despencaram nos últimos anos, não só no Brasil como no mundo.

No gráfico abaixo é possível avaliar a evolução da diferença entre a taxa de dividendo do Ibovespa e a taxa de títulos de renda fixa prefixados de dez anos de vencimento. A taxa de dividendos é calculada pela razão entre os dividendos médios pagos e o preço do índice.

Evolução da diferença entre a taxa de dividendo do Ibovespa e da taxa de juros de títulos de renda fixa prefixados de dez anos de vencimento. Fonte: Bloomberg.

Perceba que a diferença entre as duas taxas está no seu máximo dos últimos 12 anos. Mesmo com a alta dos preços das ações, relativamente às taxas de juros, nunca se ganhou em dividendos tanto quanto agora.

Deve-se lembrar que o investidor de ações ganha não apenas com os dividendos, mas também com a valorização dos preços.

No caso americano (gráfico abaixo), a taxa de dividendos atual está inclusive acima das taxas de juros. É possível ver que historicamente a taxa de dividendos costuma ser inferior a de juros.

Evolução da diferença entre a taxa de dividendo do S&P 500 e da taxa de juros de títulos de renda fixa prefixados de dez anos de vencimento americana. Fonte: Bloomberg.

Portanto, a alternativa ao investimento em ações, que é investir em renda fixa, está relativamente pior no atual momento que no passado. Logo, permite que os índices negociem com múltiplos superiores às suas médias históricas.

Adicionalmente, os preços podem continuar subindo, pois a expectativa dos analistas consolidada pela Bloomberg é que os lucros no Brasil continuem subindo 15% ao ano nos próximos anos, suportando uma alta de mesma intensidade para o Ibovespa.

Apesar dos argumentos favoráveis, é importante ressaltar que bolsa de valores é uma aplicação de alto risco e o investimento deve ser feito com cautela e sempre considerando o perfil de investidor. Adicionalmente, destaco que a forma mais eficiente de investir em bolsa é por meio de fundos de ações, pois é possível contar com uma equipe de especialistas, além de outras vantagens.

Michael Viriato é professor de finanças do Insper e sócio fundador da Casa do Investidor.