Dicas para lidar com seu orçamento familiar nesta crise

A recente crise provocada pela pandemia do Coronavírus chegou em um momento desfavorável para os brasileiros. Segundo pesquisa divulgada ao final de março pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o percentual de famílias endividadas está em seu máximo desde 2010. Comento algumas dicas para ajudar você com seu orçamento familiar.

Conforme apresentado no gráfico abaixo, com dados da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), mais de 66% das famílias se encontram endividadas. Adicionalmente, mais de 10% destas já se declaram incapazes de saldar suas dívidas antes mesmo das dificuldades deste momento as abaterem.

Percentual de famílias endividadas e que não terão condição de pagar suas dívidas. Fonte: Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic).

Para todos há uma solução. Mesmo para aqueles mais endividados.

 

Evite dívidas e renegocie as existentes

O período de isolamento eleva a ansiedade das pessoas e a válvula de escape muitas vezes são as compras. Como não podem sair de casa, compram pela internet por meio de cartão de crédito, muitas vezes sem ter a capacidade de pagar, o que gera novas dívidas.

Luiz Henrique Garcia, CEO da QuiteJá, plataforma digital de renegociação de dívidas, adverte “Se não for usado com inteligência, vira uma bola de neve de dívidas. É fundamental analisar quanto fica uma compra realizada no cartão, os juros, prazos de vencimento, perante a chance de pagar à vista. É melhor fazer uma economia de recursos para tentar efetuar a compra pagando na hora. Se não tiver jeito, negociar uma entrada do valor para abater o restante dentro do seu orçamento, evitando assim ficar no vermelho, neste cenário em que vivemos, é o melhor a se fazer”.

Segundo a Peic, a maior parte das famílias endividadas possuem débitos no cartão de crédito. Esta é uma das modalidades de crédito com maior taxa de juros.

Nenhum credor quer ficar sem receber. Portanto, procure as instituições financeiras para trocar a modalidade do crédito e assim ter uma taxa de juros e parcela que caiba no seu bolso.

No entanto, muitos se encontram com seus rendimentos comprometidos por perda de emprego ou redução de salário. Então aqui vai a primeira dica para esta situação.

 

Venda ativos

Você provavelmente vai lembrar que várias empresas passaram por dificuldades financeiras na última recessão brasileira, em 2015, e na crise financeira de 2008. Lembra do que elas fizeram?

A Petrobrás foi uma delas. Desde 2016, a empresa tem implementado um programa de venda de ativos como forma de ajudar a reduzir seu endividamento. No ano passado ela vendeu mais de US$10 bilhões em empresas e reservas que possuía.

Você também pode fazer o mesmo. Aproveite que as pessoas estão em casa e atentas na internet para anunciar bens que você não usa mais.

Um ativo que deve considerar a venda e que pode salvar seu orçamento nos próximos meses é seu automóvel, mesmo que seja com desconto. Não se apegue a bens materiais. Da mesma forma que conseguiu adquiri-los no passado, vai tornar a poder comprar quando a situação melhorar.

Outra fonte de receita virá pelo corte de gastos. Para isso, precisa trabalhar em seu orçamento familiar.

 

Um planejamento começa com uma lista das despesas

Pense no orçamento familiar como a lista de compras que deve ser feita antes de ir ao supermercado. Caso não faça a lista de compras antes, provavelmente vai comprar mais do que o necessário de alguns itens, outros serão esquecidos e para piorar artigos supérfluos serão adquiridos por impulso.

A previsão do orçamento familiar é mais simples que a corporativa. O maior benefício está relacionado a evitar gastos desnecessários e fazer com que em vez de terminar os meses com dívidas, consiga investir para momentos de emergência e para a aposentadoria. Quanto mais detalhado for o orçamento, melhor. Muitas vezes são as pequenas despesas que mais penalizam. Como dizia Benjamin Franklin: “um pequeno buraco afunda um grande navio”.

Seu objetivo é avaliar as despesas listadas na figura abaixo. Inicie estimando a receita mensal da família. Assim, poderá calcular os percentuais dos gastos sobre essa renda. Lembre-se de considerar os ganhos de décimo terceiro e adicional de férias, caso seja funcionário de uma empresa. Ao final do levantamento, é esperado que os percentuais estejam abaixo dos identificados na figura.

Percentuais objetivo para seu orçamento familiar.

Os itens cujos gastos estejam com percentuais acima do desejado devem ser prioritariamente reavaliados.

O percentual atribuído aos investimentos é o valor que sobra depois da consideração de todas as despesas. Portanto, ao contrário dos outros, esse é o percentual mínimo e não o máximo a ser alocado de sua renda. Neste momento, esta parcela de investimento servirá para saldar dívidas existentes.

Depois de elencar todos os gastos, tente classificá-los em despesas fixas e variáveis. Algumas despesas variáveis serão reduzidas neste momento, pois você está em casa. Por exemplo, combustível para o automóvel e alimentação fora de casa.

Muitas das despesas fixas estão relacionadas ao segmento de habitação. O custo habitacional em geral é a maior despesa familiar. Ele inclui além do aluguel ou despesa de financiamento do imóvel, o condomínio, os gastos com concessionárias de serviços públicos (água, luz, internet, TV, …), eletrodomésticos, manutenção e outros.

Busque cortar ou reduzir as despesas fixas. Negocie com o proprietário de seu imóvel um desconto no aluguel. Sente com os condôminos de seu prédio e estudem cortes para redução da despesa, por exemplo: iluminação de áreas comuns, uso de elevadores e necessidade de funcionários como um zelador.

Analise a adequação dos gastos de internet, TV e celular. Uma simples ligação para a operadora do serviço pode render um bom desconto.

Na crise energética de 2001, brasileiros não acreditavam que seriam capazes de economizar 20% em suas contas de energia. No final, conseguiram até mais.

As medidas adotadas neste período podem ser uma excelente educação financeira permanente para os brasileiros assim como foi o aprendizado em economizar energia de 2001.

 

Michael Viriato é professor de finanças do Insper e sócio fundador da Casa do Investidor.