O que fazer com os fundos imobiliários nesta crise?
De forma similar às crises passadas, os ativos de risco apresentaram forte desvalorização neste ano. No entanto, esta queda não foi justificada porque os preços estavam caros, mas devido ao receio de redução de receitas promovida pelo fechamento mandatório das atividades de empresas pela pandemia do Coronavírus. Alguns ativos devem perder mais receita que outros e alguns possuem custo fixo elevado, logo, serão muito mais prejudicados. Todavia, uma classe de investimentos não deveria ter sido tão afetada.
Nos últimos cinco anos, encerrados em 2019, os Fundos de Investimentos Imobiliários (FIIs) se valorizaram uma média de 18,8% ao ano. Segundo o portal FipeZap, neste intervalo de tempo, tanto o preço de imóveis comerciais como os aluguéis médios destes apresentaram queda. Então o que teria justificado a alta?
O gráfico abaixo descreve a evolução do índice de títulos públicos referenciados a IPCA com vencimento superior a cinco anos (IMAB5+) e do índice de FIIs (IFIX).
Os títulos referenciados a IPCA remuneram uma taxa de juros prefixada que incide sobre o principal e este é reajustado pela inflação. Os FIIs possuem estrutura similar. Eles pagam um dividendo que é proveniente dos aluguéis dos imóveis e este aluguel normalmente é reajustado pela inflação. Portanto, é razoável dizer que ambos remuneram uma taxa fixa acrescida da inflação. Por isso, no gráfico ambos os índices parecem evoluir de forma similar.
Desde 2016, a taxa básica da economia, conhecida como Selic, caiu de 14,25% ao ano para os atuais 3,75% a ano. Essa queda impulsionou os títulos referenciados a IPCA e, consequentemente, também os FIIs. Esta efeito pode ser observado no gráfico acima.
Entretanto, perceba que durante o mês de março de 2020 os FIIs sofreram de forma muito mais acentuada. Enquanto o IMAB5+ caiu apenas 5,9% no ano até o dia 17/04, o IFIX se desvalorizou 19,2%.
É possível atribuir a queda mais acentuada ao maior risco dos FIIs em relação aos títulos públicos. No entanto, esta desvalorização foi além do esperado e foi provocada pela aversão ao risco mais elevada dos investidores neste momento.
A figura a seguir mostra a evolução da volatilidade anual dos retornos dos índices Ibovespa, IFIX e IMAB5+. Perceba que a volatilidade do IFIX foi inferior à do IMAB5+ desde 2015. Somente em março a volatilidade do IFIX superou a do IMAB5+. E esse risco está próximo do risco do Ibovespa. Portanto, investidores estão colocando no preço atual um risco superior ao natural desta classe.
Outro risco dos FIIs, neste momento, seria o não recebimento dos aluguéis por inadimplência dos locatários. No entanto, mesmo se considerarmos o caso extremo em que 100% dos aluguéis de todos os FIIs não sejam pagos pelos próximos seis meses, a queda não deveria ter sido desta magnitude.
A perda de metade do aluguel de um ano em toda a vida de um imóvel representaria uma perda de valor de no máximo 5%. Sabemos que apenas alguns FIIs vão ser mais afetados e não será por seis meses e nem a perda de todo o aluguel. Logo, também não justificaria a queda do IFIX de quase 15% acima do IMAB5+.
Observando o gráfico abaixo, é possível ver que a relação entre o dividendo mensal dos FIIs e o CDI está próxima da máxima dos últimos seis anos. O ganho por dividendo mensal médio dos FIIs representa quase o dobro da remuneração do CDI.
Esta crise ainda não acabou e mais volatilidade pode ocorrer nos mercados. Portanto, não é possível afirmar que os FIIs não possam apresentar novas desvalorizações. Entretanto, para o longo prazo, a queda já representa um bom ponto de entrada.
Michael Viriato é professor de finanças do Insper e sócio fundador da Casa do Investidor.