Buffett surpreende e alerta investidores em sua reunião anual

Uma tradição de décadas foi quebrada neste ano. Investidores chegam a comprar pelo menos uma ação da empresa Berkshire Hathaway para poderem participar da reunião anual presidida por Warren Buffett que ocorre presencialmente na cidade de Omaha nos EUA. A reunião de quatro horas de duração ocorreu apenas de forma online neste sábado pela noite. Comento alguns pontos desta aula de um dos mais bem sucedidos investidores do mundo.

Mensagem

Em seu discurso inicial, Buffett dispendeu grande parte do tempo para dar duas mensagens. Uma delas ele frisou por duas vezes, em seus poucos slides utilizados na apresentação, e foi repetida nas entrelinhas durantes suas respostas às perguntas:

“Never, ever, bet against America” (“Nunca, nunca, aposte contra os EUA”).

Para defender esta afirmação, o mega investidor de 89 anos descreveu os percalços que o país passou ao longo de sua história e como o país se ajustou para superá-los.

Acreditando em uma adaptação a este período de pandemia é que Buffett faz a segunda afirmação. Segundo ele, o período atual é um excelente momento para comprar ações e que estas devem desempenhar melhor que os títulos do governo americano. No entanto, ele não recomenda que investidores comprem diretamente as ações pelo risco envolvido.

Alerta

Apesar de seu aparente otimismo, suas operações recentes e resposta a algumas perguntas demonstram uma cautela que deve ser considerada pelos investidores.

Demonstrando esta cautela ele destaca que sua visão positiva no investimento em ações deve considerar um prazo de vinte anos. Por meio de uma analogia, Buffett ensina que se deve investir em ações da mesma forma que se investiria em uma fazenda. Ou seja, não se deve olhar para o preço da terra no curto prazo, mas apenas o que esta terra vai gerar nos anos futuros.

Segundo ele, não é possível saber o que vai ocorrer com o mercado no próximo mês ou ano, mas sua convicção positiva reside apenas no longo prazo.

Dois fatos adicionais do portfólio da Berkshire refletem sua precaução. Primeiro, seu portfólio se encontra com o valor máximo histórico em caixa. Buffett argumenta que esta posição sempre foi grande para poder aproveitar oportunidades de aquisição a preços baixos.

No entanto, em vez de comprar mais ativos quando o mercado atingiu sua mínima nestes dois meses, ele vendeu.

No final do ano, ele tinha uma posição de quase US$10 bilhões em quatro empresas aéreas americanas. Pelas consequências da crise, estas ações caíram mais de 50% e foi no pior momento que Buffett se desfez de sua participação.

A justificativa para esta atitude foi que ele acredita que pessoas e empresas irão mudar seus comportamentos de viagem e isto se refletirá negativamente para o setor. Embora pareça uma atitude impensada, é uma importante lição para aqueles que fazem investimentos diretos em ações.

Não se deve segurar um investimento com prejuízo torcendo que ele volte para o preço inicial, se a perspectiva mudar para negativa. Avalie o que você poderia fazer melhor com o recurso e recupere o valor perdido com este novo investimento.

Críticas ao Desempenho

Acionistas não se intimidaram em criticar o desempenho recente de Buffett.

Apesar do histórico excelente ao longo de 55 anos na gestão dos recursos por meio da Berkshire, recentemente, o desempenho não tem correspondidos às expectativas. O retorno de 10% acima do S&P500 alcançado ao longo de toda a história poderia ser maior, não fosse os últimos anos.

O retorno acumulado da Berkshire nos últimos cinco anos, encerrados na última sexta-feira, perde do índice da bolsa americana S&P500. O próprio Buffett recomenda o investimento neste índice como uma das melhores formas de investimento de longo prazo.

Buffett argumenta a dificuldade para bater no curto prazo um índice diversificado como o S&P500. Segundo ele, o tamanho de seu portfólio, que é de mais de meio trilhão de dólares de ativos dificulta esta tarefa.
Estes são dois importantes ensinamentos. Primeiro, mesmo excelentes gestores podem ir mal em períodos mais curtos de tempo. Segundo, o tamanho do portfólio é uma característica que pode prejudicar o retorno. Por isso, muitos gestores fecham seus fundos para captação.

No ano de 2020, as ações da Berkshire se desvalorizam 19,3% contra uma perda de apenas 12,3% do S&P500. Abaixo mostro o desempenho das principais ações de sua carteira de ativos negociados em bolsa. Esta carteira representa cerca de um terço do total de ativos da Berkshire.

Carteira com as principais participações em ações negociadas em bolsa da Berkshire Hathaway. As ações grifadas em amarelo foram vendidas em abril. Fonte: CNBC e Bloomberg.

Michael Viriato é professor de finanças do Insper e sócio fundador da Casa do Investidor.