Três investimentos para você viver de renda e qual eu mais gosto

Desafio quem não deseja ter um patrimônio financeiro capaz de gerar uma renda passiva suficiente para  sua independência financeira. No entanto, não basta ter um grande patrimônio para garantir uma renda sustentável. É importante investir nos produtos certos. Discuto abaixo três investimentos e qual patrimônio você precisaria possuir para ter uma renda mensal de R$ 5 mil.

A maior parte dos investidores associa aplicações financeiras a dois veículos: a caderneta de poupança e aplicações de curto prazo referenciadas ao CDI ou à taxa Selic. No entanto, estes três não possuem uma característica essencial para quem pensa em viver de renda.

No passado, até era possível se imaginar um investidor viver de renda com o patrimônio aplicado em títulos referenciados ao CDI ou Selic.

O gráfico a seguir apresenta no painel superior a evolução da taxa Selic e da inflação medida pelo IPCA. O painel inferior tem a diferença entre as duas taxas. Perceba que até 2017, a diferença entre as duas taxas, chamada de juros real de curto prazo, era na média superior a 4% ao ano.

No painel superior, encontra-se a evolução da taxa básica de juros, Selic, e do IPCA. No painel inferior, apresenta-se a diferença entre estas duas taxas, ou seja, a taxa real de juros de curto prazo. Fonte e elaboração: Bloomberg.

Portanto, quem investia nestes títulos, ganhava sem correr risco e com liquidez um retorno de 4% acima da inflação. Esta vantagem acabou. Perceba que a partir de 2020, os juros reais de curto prazo passaram a ser negativos. Isto quer dizer que você perde poder de compra se investe nele.

Portanto, caderneta de poupança, CDI e Selic não deveriam ser ativos a investir para quem quer viver de renda. Pelo menos, deveriam ser a menor parcela.

Você já entendeu qual atributo falta a estes ativos. A proteção para a inflação é uma importante característica necessária para que um veículo financeiro se caracterize como adequado para os rentistas.

Comento abaixo três ativos você deveria considerar e ressalto qual mais gosto.

 

Renda Fixa

Apesar de descartarmos os ativos citados anteriormente, não quer dizer que toda a renda fixa esteja descartada.

Os títulos de renda referenciados ao IPCA proporcionam no longo prazo uma rentabilidade formada por dois elementos: inflação e juros real.

No caso dos títulos públicos, popularmente conhecidos por Tesouro IPCA (ou NTN-B) a rentabilidade de longo prazo está em 4% ao ano mais o IPCA

O nome Tesouro IPCA advém da plataforma onde cerca de 10% destes títulos foram emitidos, o sistema da B3 denominado Tesouro Direto.

Considerando esta rentabilidade acima da inflação seria necessário R$ 1,5 milhões nestes títulos para ter uma renda bruta de IR de R$5 mil.

No entanto, o retorno dos títulos públicos é tributado. Logo, seria necessário um investimento acima de R$ 2 milhões para ter a renda de R$ 5 mil mensais líquidos de IR.

Os títulos privados referenciados ao IPCA, possuem uma vantagem em relação aos títulos públicos que é a remuneração superior. Em média, eles apresentam uma taxa real 20% superior. Adicionalmente, algumas emissões possuem o benefício de isenção de IR.

Entretanto, esse prêmio de rentabilidade não é de graça, estas aplicações possuem maior risco e, por isso, demandam um maior trabalho de análise de crédito. Em função deste risco, uma carteira de títulos privados deve ser bem diversificada e nenhum emissor individual deveria representar mais de 4% de seu patrimônio.

Considerando os maiores ganhos, é necessário investir proporcionalmente menos nesses títulos para ter os mesmos ganhos mensais.

O ideal para aquele que sonha em viver de renda é construir uma carteira que incorpore pelo menos duas das alternativas de investimentos descritas acima. Também é importante ponderar adequadamente as opções de acordo com seu perfil de investidor.

Quando se investe em renda fixa, o retorno esperado é somente pelos juros. Existem alternativas que podem proporcionar ao investidor também ganhos de capital. No caso dos títulos de renda fixa, o ganho de capital que eventualmente seja recebido nada mais é do que a antecipação dos ganhos de juros futuros.

Imóveis

Os imóveis são um dos veículos preferidos daqueles que almejam viver de renda. Embora mais arriscados que títulos de renda fixa, a atratividade dos imóveis para investidores é a capacidade de se tocar nele, o que traz ao investidor uma falsa sensação de segurança.

Observa-se no gráfico abaixo que a rentabilidade obtida em investimentos imobiliários caiu conjuntamente com a redução da taxa básica (Selic), mencionada acima.

Evolução da taxa básica de juros, Selic, e das taxas de rendimento de aluguel de imóvel comercial e residencial. Fonte e elaboração: FipeZap.

A linha amarela reflete o rendimento de aluguel de imóveis residenciais e a verde de imóveis comerciais. O valor do aluguel é corrigido anualmente pela inflação. Portanto, é possível considerar este rendimento como juros real.

Atualmente, o rendimento médio de imóveis comerciais, que é superior ao residencial, é de 5,41% ao ano. Entretanto, este rendimento está longe de ser líquido para o investidor. Existe o IR e todos os custos associados, como imobiliária, manutenção, vacância e outros. O retorno líquido para o proprietário cai pelo menos 40%. Assim, o rendimento líquido a considerar seria de 3,2% ao ano acima da inflação.

Portanto, o valor investido em imóveis comerciais necessário para ter a mesma renda mensal de R$ 5 mil é de R$ 1,88 milhões.

O investimento em um imóvel diretamente tem quatro desvantagens: falta de liquidez, alto custo de transação, imposto de renda sobre os rendimentos e maior risco pela falta de diversificação. Todas essas características negativas são superadas com o investimento por meio de fundos de investimentos imobiliários (FIIs).

Os FIIs atendem a todas as vantagens de uma aplicação para rentistas. Além de suplantar as desvantagens do investimento direto em imóvel, os FIIs têm um benefício adicional.

Eles possuem uma rentabilidade líquida de IR superior à obtida no investimento imobiliário direto. O gráfico abaixo apresenta o dividendo médio recebido dos FIIs, comparado aos juros reais dos títulos públicos referenciados à inflação de longo prazo.

Evolução da taxa de juros real dos títulos públicos referenciados a IPCA de longo prazo e do dividendo médio no IFIX, índice de fundos imobiliários da B3. Fonte e elaboração: Bloomberg.

Como os FIIs, em média, apresentam um ganho em dividendos de 0,55% ao mês (ou 6,6% ao ano), bastaria um investimento de R$ 900 mil para ter a renda mensal de R$ 5 mil líquidos de IR.

 

Ações pagadoras de dividendos

Em média, empresas pagadoras de dividendos proporcionam uma rentabilidade de 4,8% ao ano. Esse retorno é calculado dividindo o valor do dividendo pelo preço de mercado da ação.

É possível dizer que este valor é real, ou seja, acima da inflação, pois as empresas repassam a inflação nos preços de seus bens e serviços vendidos. Portanto, no longo prazo, é possível assumir que os lucros deveriam subir pelo menos a inflação.

Considerando a rentabilidade de 4,8% ao ano, seria necessário um patrimônio de R$ 1,25 milhões em uma carteira de ações para ter uma renda equivalente a R$5 mil mensais.

 

Qual deles eu mais gosto

Perceba que mesmo o dividendo médio das ações mais pagadoras de dividendos é aquém do recebido pelos FIIs. Veja no gráfico abaixo a evolução da taxa de dividendos média dos fundos imobiliários e de ações pagadoras de dividendos.

Evolução da taxa de dividendos média do IDIV, índice de ações pagadoras de dividendos da B3, e do IFIX. Fonte e elaboração: Bloomberg.

Embora os FIIs apresentem volatilidade nos preços por negociar em bolsa, as ações apresentam volatilidade ainda superior.

Outra desvantagem das ações em relação aos FIIs é a necessidade de um trabalho muito mais ativo para gerir essa carteira de ações. São necessárias pesquisas e acompanhamento aprofundado para entender se a empresa não pode perder sua capacidade de geração de lucros e, consequentemente, de pagamento de dividendos.

Alguém poderia argumentar que as ações poderiam apresentar um maior ganho de capital. É possível, mas isso não foi verdade na última década, quando comparamos os dois.

Evolução dos preços do IDIV e IFIX na última década. O IFIX obteve retorno maior que o IDIV. Fonte e elaboração: Bloomberg.

O gráfico acima apresenta na linha branca o IFIX que é o índice de FIIs da B3 e na linha amarela o IDIV que é o índice de empresas pagadoras de dividendos da B3. O IFIX além de apresentar maior retorno que o IDIV na última década, teve menor risco medido pela volatilidade.

Assim, neste momento, o veículo que acredito ser o mais eficiente para viver de renda são os fundos imobiliários.

Alerto que todas estas alternativas apresentam algum tipo de risco e devem ser ponderadas em um portfólio diversificado considerando o perfil de investidor.

 

Michael Viriato é professor de finanças do Insper e sócio fundador da Casa do Investidor.