Descubra quando vale a pena financiar seus investimentos

A grande maioria dos brasileiros investe em imóveis financiando parte da aquisição. O conhecimento comum diz que se você não tem os recursos, deveria financiar a aquisição. No entanto este pensamento está errado. Explico a razão que você deveria considerar na decisão de pegar recursos emprestados e que outros investimentos também poderia financiar.

Enquanto no Brasil financiar os investimentos ainda é algo restrito ao mercado imobiliário, internacionalmente, esta atitude vai além deste tipo de aplicação. Entretanto, esta prática internacional começa a se expandir também no Brasil.

Antes de abordar quando vale a pena financiar os investimentos, responderei a duas questões, anteriores e importantes, para a compreensão da primeira dúvida. Explicarei o que é financiar os investimentos.

 

O que representa financiar os investimentos?

O ato de financiar investimentos é uma prática no mercado corporativo. Você, provavelmente, já ouviu falar que uma empresa para adquirir outra companhia tomou uma dívida no mercado.

Você, possivelmente, também, investiu em um imóvel, mas pegou dinheiro emprestado no banco para pagar parte da aquisição.

Estas duas atitudes parecem muito naturais para a maioria das pessoas. No entanto, será que acharia natural se endividar para adquirir um dos investimentos abaixo?

a) Investir no Ibovespa, o principal índice de ações brasileiras;

b) Investir no S&P500, o principal índice de ações americanas;

c) Investir em empresas em estágio inicial, no Brasil;

d) Investir em fundos imobiliários.

Perceba que as três primeiras alternativas não são diferentes do caso inicial, de quando uma empresa se endivida para adquirir outra.

A quarta alternativa, que representa pegar dinheiro emprestado para investir em fundos imobiliários não é diferente de se endividar para adquirir um imóvel. Afinal, fundos imobiliários representam um veículo de aquisição de imóveis.

Então por que somos resistentes a financiar parte dos investimentos citados?

Existem algumas razões, mas uma é dominante. Nós brasileiros não estamos acostumados com o financiamento de ativos que possuem variação de preço no mercado.

A variação de preço no mercado traz uma sensação de elevação da incerteza percebida, quanto ao retorno do ativo no futuro. E é justamente este fator que determina a razão de financiarmos.

 

Por que financiamos?

Existem duas razões para pegarmos um empréstimo para aquisição de um bem. A primeira está relacionada à satisfação pessoal.

Desejamos ter a posse de um bem agora e não temos todo o recurso necessário para o adquirir. Desta forma, pegamos emprestado parte dos recursos.

Quando o motivo é esse, o financiamento tem maior probabilidade de ser malsucedido quando avaliado sob a ótica financeira.

Neste caso, trocamos o ganho financeiro pelo ganho na satisfação pessoal. Assim, pouco importa se o ativo, por exemplo, um imóvel vai se valorizar ou não. Estamos interessados apenas em nos satisfazer.

Sou capaz de apostar que a maior parte das aquisições de imóveis financiadas estão neste primeiro caso.

A segunda razão para financiar uma aquisição é a que, por exemplo, empresas usam para fazer grandes investimentos.

Quando uma companhia decide por comprar outra, analisa-se o retorno que se deve obter na aquisição. O retorno esperado sobre o investimento é o principal indicador financeiro a se avaliar, quando se pretende financiar a aquisição.

A razão para se pegar recursos emprestados para fazer a aquisição é você alavancar, ou seja, elevar os rendimentos esperados sobre o capital investido. Para entender esta elevação do retorno, explicarei por meio de um exemplo e responder, assim, à pergunta principal.

 

Quando vale financiar?

Considere que você tem R$ 100 mil e pretende fazer um investimento no qual espera obter um retorno de 25% ao ano. Assuma que você pode pegar R$ 200 mil emprestados a uma taxa de juros de 10% ao ano.

Caso 1 – investimento sem financiar:
Investindo os R$ 100 mil nesta aplicação por um período de cinco anos, teria um retorno de 205,2% (= (1+0,25)^5 – 1). Ao final do período, seu investimento se transformou em R$ 305,2 mil.

No entanto, você tem a oportunidade de elevar a rentabilidade. Considere que você invista R$ 300 mil na aplicação, mas financia os R$ 200 mil adicionais que não possui nas condições estabelecidas acima. Desta forma, você pode obter uma rentabilidade maior sobre o capital de R$ 100 mil.

Caso 2 – investimento com financiamento:

O valor de R$ 300 mil irá rentabilizar o mesmo retorno de 205,2%. Assim, os R$ 300 mil se transformam em R$ 915,5 mi, mas parte disto servirá para pagar o empréstimo. A dívida sobe de R$ 200 mil para R$ 322,1 mil com os juros. Subtraindo o ganho final de R$ 915,5 mil da dívida, restará para você um total de R$ 593,4 mil.

Portanto, você aplicou R$ 100 mil de seu capital e terminou com R$ 593,4 mil. Isto representa um retorno de 493,4% sobre o capital investido. Logo, financiando você conseguiu obter mais que o dobro de retorno do que teria se investisse sem financiar.

Veja que o empréstimo funciona como uma alavanca que eleva o retorno do capital investido.

No entanto, isso só funciona se o retorno sobre o ativo investido for maior que o custo do empréstimo.

Se o retorno do ativo for inferior ao do custo do financiamento, você pode ter perdas significativas.

Caso 3 – imóvel financiado:

Suponha que você pretende comprar um imóvel de R$ 500 mil e que este apartamento apresente um retorno esperado de 5% ao ano nos próximo 15 anos. Por não ter todos os recursos, você decide financiar 80% do imóvel, ou seja R$ 400 mil a uma taxa de 7% ao ano.

Neste caso, ao final de 15 anos, seu  apartamento estará valendo R$ 1,04 milhões. Parece que fez um grande negócio. No entanto, você terá pago no empréstimo o valor de R$ 1,1 milhões. Isso resulta em um prejuízo aproximado de R$60 mil. Assim, seus R$100 mil inicial se transformarão em menos R$ 40 mil. Portanto,  seu retorno seria equivalente a aplicar os R$ 100 mil em uma aplicação que rende -5,9% ao ano.

Assim, quando pensar em comprar um imóvel ou qualquer investimento financiado, avalie com cuidado o retorno esperado no investimento. Caso acredite que o imóvel não vai se valorizar mais que a taxa de juros do empréstimo, não financie.

Na realização de qualquer investimento, seja ele em bolsa de valores ou imóveis, o raciocínio na decisão de financiar parte da aquisição é o mesmo. Se acredita que o retorno sobre o investimento será superior à taxa de juros do empréstimo, vale financiar o investimento, pois eleva a rentabilidade obtida. Entretanto, deve-se considerar que o risco, quando financia, também é maior.

 

Michael Viriato é professor de finanças do Insper e sócio fundador da Casa do Investidor.