Cinco alertas antes de contratar um robô trader
O mercado financeiro sofreu grande transformação nas últimas duas décadas com o avanço da tecnologia. Além da popularização do acesso aos investidores, os custos de negociação ficaram mais baratos e a velocidade e quantidade de operações cresceram exponencialmente.
Qualquer pessoa com celular tem acesso a uma plataforma de negociação nos mercados de ações e de derivativos que antes só estavam disponíveis a operadores em grandes bancos. Adicionalmente, a evolução nos sistemas permite hoje que simples investidores programem regras de negociação que são realizadas de forma autônoma, ou seja, sem a necessidade de interferência humana.
Diariamente, somos expostos a elevado volume de decisões que causa forte pressão emocional e stress. Portanto, a promessa de que uma máquina poderia nos livrar das decisões financeiras e proporcionar lucros acima da média é irresistível.
Explico abaixo que essa promessa deve ser avaliada com cuidado para não se transformar em um grande prejuízo.
Cuidado com retornos passados atraentes
Todos já assistimos à vídeos surpreendentes em que uma pessoa faz arremesso a uma grande distância e acerta a cesta. Você é uma pessoa inteligente e sabe que para fazer aquele vídeo, foram realizadas inúmeras tentativas e somente a bem-sucedida é apresentada.
Não se engane, a mesma estratégia é empregada para atrair a atenção de investidores que buscam os robôs traders.
Se você testar diferentes metodologias de cálculo, vai encontrar uma que funcionou no passado com probabilidade alta. Basta mostrar alguns gráficos e a possibilidade de ganhos dessas estratégias para despertar o sentimento de ambição de qualquer investidor.
Os acadêmicos chamam esse viés, de “martelar” os dados até que eles “falem” o que queremos, de data snooping.
Para aferir a eficácia de um modelo, não basta verificar quantas vezes ele proporcionou operações com lucro em um determinado período, no passado. São necessários vários testes estatísticos em condições diferentes. Afinal, o futuro, provavelmente, não vai ser uma simples repetição do passado. E isso nos leva a atentar para os perigos de perda.
Risco
Os riscos destes robôs não podem ser relevados.
As propagandas destes sistemas focam apenas nos altos retornos e nas elevadas proporções de acerto, mas lembre-se de investigar com atenção as perdas.
O fato de uma metodologia ter acertado oitenta por cento do tempo no último ano, quer dizer que ela perdeu nos 20% em que determinados eventos ocorreram. Se no futuro, os padrões de preço que levaram a esta participação de perda se repetirem com mais frequência, seu prejuízo pode se acumular e drenar todo seu capital operacional.
Avalie com cuidado a intensidade de perda nos casos negativos e o controle de risco do modelo nos casos de ocorrência.
Atente para os custos
As negociações por meio de algoritmos, normalmente, geram volumes de operações bem acima da média para investidores comuns. Alguns sistemas podem executar mais de mil ordens em um único dia.
Fique atento, quando calcular as possibilidades de retorno, para incluir o correto custo de transação.
Lembre-se, também, de incluir o custo de programação e manutenção da plataforma de operação. As plataformas cobram mensalidades proporcionais à complexidade dos modelos entre R$100 a mais de R$1000.
Avaliação de terceiros
Além da capacidade de gerar lucros, um robô é tão bom quanto mais fiel ele é em executar os comandos programados. Falhas de execução ou interrupções podem produzir sérios prejuízos.
Portanto, é importante analisar as avaliações e reclamações de usuários. Busque nos sítios de reclamação por comentários de descontentamento.
Complexidade dos modelos
Não se iluda. Se apenas uma média móvel dos preços passados de um ativo fosse capaz de produzir ganhos consistentes, as gestoras de recursos demitiriam uma multidão de analistas e gestores. Esses profissionais representam o maior custo para os fundos de investimento. Se pudessem ser trocados por um simples computador, as instituições financeiras já o teriam feito.
De fato, estas instituições estão atentas à evolução tecnológica. Muitas dispendem fortunas na contratação de PhDs, para elaborar e testar complexos modelos, de especialistas em programação, para implementá-los, e em computadores e tecnologia de comunicação, necessários para executar as operações de forma mais rápida e segura. Todo este investimento é preciso, pois, como você, elas sabem que o mercado financeiro é um ambiente altamente competitivo e possibilidades de ganhos fáceis não existem. Adicionalmente, essas instituições, pelo tamanho, possuem acesso a custos de transação diferenciados de investidores comuns.
Não quero dizer que apenas modelos complexos seriam capazes de produzir lucro, mas não existe um modelo simples que vai funcionar para sempre e sem a necessidade de ajustes com frequência.
Cuidado para não cair na falácia do dinheiro fácil, sem esforço e sem risco.
Michael Viriato é professor de finanças do Insper e sócio fundador da Casa do Investidor.