O que tem acontecido com as ações pagadoras de dividendos?
Normalmente consideradas o porto seguro do mercado acionário, as ações de empresas com elevado nível de dividendos têm decepcionado os investidores ultimamente. Desta forma, comento as razões que justificam o desempenho inferior e as perspectivas.
Segundo a Anbima, dos R$ 249 bilhões em ativos investidos em fundos de ações, ao final de julho de 2018, apenas R$ 6 bilhões eram fundos classificados como de dividendos.
Ao contrário do que se infere pelo baixo investimento relativo, seu desempenho de longo prazo surpreende. Como pode ser visto no gráfico abaixo, o índice de ações pagadoras de dividendos (IDIV), calculado pelo B3 (antiga Bovespa), tem desempenho bem superior ao Ibovespa.
Desde 2005, quando foi criado, o IDIV se valorizou até a última sexta (06/set) 291%. Enquanto o Ibovespa subiu apenas 128% no mesmo período. Portanto, um investimento de R$ 10.000 no IDIV e no Ibovespa, em 30/12/2005, se transformou em R$ 39.100,00 e R$ 22.800, respectivamente.
No mesmo período, quem investiu em um ativo remunerado ao CDI ganhou 274%. Logo, além de apresentar mais que o dobro da valorização do índice, mais acompanhado do mercado, o índice de dividendos também superou o CDI no longo prazo.
Este desempenho diferenciado da estratégia de dividendos não ocorre apenas no Brasil. Segundo o estudo de Sue Visscher e Greg Filbeck de 2003, publicado no prestigiado periódico Financial Analysts Journal, a estratégia de dividendos foi bem sucedida por vários anos e em diversos paises.
No entanto, conforme apresentado no gráfico abaixo, nos últimos 12 meses, a valorização do IDIV está aquém do Ibovespa.
Dois motivos justificam esta pior valorização.
Juros
Ações de empresas pagadoras de dividendos são, usualmente, comparadas a títulos de renda fixa referenciados à inflação de longo prazo. Esta comparação é justificada, pois seus dividendos são periódicos e, como a receita das empresas tende a subir com a inflação, seus dividendos também se elevariam. Muitas empresas pertencentes ao IDIV são concessionárias de serviços públicos cujas receitas são atreladas ao IPCA. Pelo gráfico abaixo é possível observar a forte a relação.
Nele é apresentada a evolução de um investimento de R$ 100 no IDIV e no IMA-B5+ nos últimos 12 meses. O IMA-B5+ é o índice calculado pela Anbima que representa uma cesta com todos os títulos públicos federais referenciados ao IPCA e com vencimento superior a 5 anos.
Com a alta da curva de juros de longo prazo, os títulos de renda fixa de prazo similar sofreram neste período. O IDIV também acompanhou este mau desempenho.
A alta da taxa de juros de longo prazo foi potencializada com os receios em relação à eleição e o compromisso dos candidatos com medidas de controle do endividamento público. Este receio e, consequentemente, as taxas de juros e as ações de dividendos devem reverter a performance com o passar da eleição.
Dólar
A recente alta do dólar também favorece o Ibovespa em relação ao IDIV. Este último índice praticamente não possui empresas cujas receitas são beneficiadas diretamente com a desvalorização do Real, enquanto o primeiro possui mais de 20% de empresas nesta situação.
No entanto, como abordamos no passado, no médio e longo prazo, a melhor forma de se proteger do câmbio é por meio de ativos referenciados à inflação. Este pensamento é justificado, pois qualquer efeito permanente do câmbio é em algum momento repassado aos preços dos bens. E as ações pagadoras de dividendos seriam beneficiadas.
As empresas pertencentes ao IDIV possuem taxa média de dividendo (dividend yield em inglês) médio superior a 7% ao ano. Esta taxa de dividendos é calculada pela razão do dividendo esperado pela cotação atual da ação, e pode ser comparada à taxa dos títulos referenciados à inflação de longo prazo que hoje estão menores que 6% ao ano.
Entretanto, diferentemente de um título de renda fixa, que paga uma taxa de juros fixa, a taxa de dividendo das empresas subiria com a evolução das receitas. Esta última deve se elevar com a retomada do crecimento do país. Portanto, estas empresas vão ser duplamente beneficiadas. Tanto com a queda da curva longa de taxa de juros, quanto com a retomada econômica.
Apesar de no longo prazo as perspectivas serem positivas para as ações de empresas pagadoras de dividendos, no curto prazo, por serem ativos de renda variável, estão sujeitos à volatilidade natural do mercado.
A melhor forma de se aproveitar deste movimento de longo prazo é por meio de uma carteira diversificada. Assim, um fundo de investimento deste tipo ou um índice diversificado (IDIV) são as melhores alternativas.
Michael Viriato é professor de finanças do Insper e sócio fundador da Casa do Investidor.